segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Insensatez

Deito-me à rede em meio a tanto barulho vindo do exterior. Aqui, no alpendre, curto um silêncio de monastério. Aquele barulho é diluído pelo agitar das árvores, o sibilar do vento às folhas e, em meio a essa maravilha, as lavras e vozes de Vinícius e Tom “Insensatez”. Gosto de ouvir aleatoriamente o que me dá prazer e me isola da mesmice cotidiana. O que leio e escuto, filtro nesse bom balanço enredado. E por aqui, pasmem, desfilam Chico “Roda-viva”, Tim “Azul da cor do mar”, Lulu “Como uma onda no mar”, Dominguinhos “Fulô de araçá” e essas meninas encantadoras com suas vozes aveludadas, a começar com Elba “Vem ficar comigo”, Simone “Um novo tempo”, Zizi Possi “Nunca”, Betânia “Depois de ter você” e um cordão de pérolas culminando com a grata revelação dos últimos tempos Flávia Bittencourt “Mar de Rosas”, numa interpretação ímpar ao que considero trivial.
Assim se dilui toda a insensatez desse mundo velho, onde perdura o desamor, a voracidade de um modelo excludente e deveras conturbado. É na música e na leitura que consigo “desligar” os botões do mundo lá de fora e vivenciar o meu mundinho alpendrado, ainda mais agora quando pardais procuram seus ninhos em copas de árvores ao meu redor. Nada há de me incomodar por longos instantes me valendo eternidades, sem o contrassenso ao mundo imputado. Ao contrário do que muitos pensam, é com letras e sons que nutro meus ouvidos e busco, nessa “promiscuidade musical e literária” - como diria minha amiga Silvia Araújo, a Silvinha - que fujo da realidade sem que a deixe de enfrentar cotidianamente.
À crueldade do mundo e ao contrassenso reinante, aconselho que clamem aos tons, aos tins e bens, como já ensinara Caetano “...Ou então cada paisano e cada capataz / Com sua burrice fará jorrar sangue demais / Nos pantanais, nas cidades, caatingas e nos gerais / Será que apenas os hermetismos pascoais / Os toms, os miltons, seus sons e seus dons geniais / Nos salvam, nos salvarão dessas trevas e nada mais”.

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