sábado, 24 de janeiro de 2015

“Paguem só a água”

Já contei sobre Seu Basto. Disse que era homem intolerante e não levava desaforo pra casa, embora espirituoso. Disse, também, não tinha “papas na língua”. Um pedido esdrúxulo era o mote para sua “ira”. Certamente Seu Basto se utilizava desses seus trejeitos para atrair clientes e fidelizar os já conquistados. A toalha “fubenta” que trazia no ombro era também algo que compunha aquele tipo exótico no trato cotidiano. “Grosso que só papel de embrulhar prego”, é como o descreve Vicente Simão, de quem me sirvo para saber um pouco mais sobre Esperança, terra que me adotou a mais de duas décadas.
Emerson Tomaz, meu companheiro de trabalho cultural e Fabiano, aparentado do jornalista Evaldo Brasil, são os personagens do episódio que passo a descrever. Claro que o fato se deu no bar de Seu Basto, após uma sessão do Cine São José, atrozmente demolido para construção do prédio que hoje serve ao Banco do Brasil, como se não houvera outro espaço que não aquele de tanta memória.
- Seu Basto, dá pra trazer duas cocadas?
- Dar nem é preciso dar, tomem as cocadas!
Contam Emerson e Fabiano que saíram esfomeados da sessão de cinema e aquelas cocadas eram um achado de tão gostosas. De tão grandes bastaram para atenuar a fome que ambos sentiam. A sede, aqui não comentada, era ainda maior que a fome. Daí os constantes pedidos que já incomodavam o dono do bar:
- Seu Basto, traga dois copos d’água!
- Vocês querem mineral?
- Não, traga da torneira, mesmo!
E assim se seguiram os pedidos de água após às meras duas cocadas:
- Seu Basto, traga mais dois copos d’água!
- Levo, agora, mineral?
- Não, traga da torneira, mesmo!
Aquela conversa mole ao pé do balcão se seguia ao que Seu Basto interfere, já sem paciência:
- E aí! Vocês querem mais alguma coisa?
- Traga mais dois copos d’água, Seu Basto!
- Da torneira, né?
- Sim! Quanto pago pelas cocadas, Seu Basto?
Perguntou um deles, ao que Seu Basto ironizou:
- As cocadas?
- Sim!
- Precisa pagar, não. Paguem só a água!

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