domingo, 22 de fevereiro de 2015

Cadeiras na calçada

O episódio da enchente do açude de Orós, no Ceará, é um marco na vida de muita gente. Lembro-me de pessoas ao pé do rádio lá de casa, vinham à busca de notícias advindas do Ceará. Àquele tempo morávamos na Rua Natividade Saldanha, em Cavaleiro, distrito de Jaboatão que muito tempo depois vem a ser Jaboatão dos Guararapes. Tempos mais tarde me informei que ocorrerá a 26 de março de 1960, em Limoeiro do Norte.
A data me serve como referência. Dali a pouco mudaríamos para o Totó, onde moramos numa casa bem espaçosa, cercas vivas no quintal e um jardim com flores diversas. Ouvi minha mãe responder à minha madrinha Tonhá numa conversa vespertina com cadeiras na calçada:
- E aí, comadre Do Carmo! Como é mesmo essa casa onde vocês vão morar?
- É uma casa bem espaçosa, comadre. Toda cercada e com um jardim bem florido. Tem até um pé de presente-bom!
Aquela expressão presente-bom ficou “zunindo” em meus ouvidos. Dormi e acordei “ruminando” aquilo no juízo. Deveria ser algo muito belo, imaginava. Chegou o dia da mudança que para nós era uma festa, não tínhamos a mínima noção do que era despedida nem o trabalho nas desarrumações e arrumações bem peculiares à empreitada. Logo nos acostumamos à nova vida e vizinhança. À esquerda tínhamos a família Ozório, seu Alberto e dona Carminha com três filhos e uma filha, todos crianças como nós. Certa vez uma bola nossa, de pequeno porte, embrenhou-se por entre a cerca de papoulas. Muito tempo se passou até que a encontramos, após uma poda, e fizemos festa naquele dia.
Meus pais, ao final daquele ano, talvez 1961, organizaram um pastoril natalino e eu fazia o papel do “véi”, só nos ensaios. A Rua ainda não contava com iluminação elétrica, mas tudo era conversado às noites de luar com cadeiras na calçada. As festas de Carnaval e São João aconteceriam dali pra frente com toda a vizinhança envolvida e participante. Quando escuto “Gente Humilde”, de Chico Buarque e Vinícius de Moraes, meu pensamento voa: “São casas simples com cadeiras na calçada...”.

Um comentário :

  1. Foi nessa casa que fui passar umas férias...Me perdia dentro dela, de tantos cômodos que a casa tinha. Rsrs

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